A biologia nos ensina que o encontro de um espermatozoide e de um óvulo gera um embrião, que gera uma nova vida. A natureza reservou esse movimento extraordinário de propagação da vida para uma complementaridade expressa em dois sexos diferentes na espécie humana. Por isso estamos aqui, por isso podemos escrever e ler esse texto. Necessariamente, você que me lê veio desse encontro de dois indivíduos. As sociedades humanas, bem antes de saberem da existência das células microscópicas, perceberam que a relação sexual de um homem com uma mulher tinha grande potencial de resultar em bebês. Ainda que a libido sexual fosse tratada de maneiras diferentes em diferentes épocas e lugares, a humanidade percebeu que havia algo de sagrado nessa relação. Sagrado, porque diferente das demais: era capaz de gerar vidas. Ainda que existissem outros afetos, outras paixões, essa tinha um toque especial, pois propagava nossa existência. Antes do Direito, da Filosofia e da Religião, nossos tataravós não precisaram de muito estudo para perceber isso. Mesmo sem Medicina, nossas avós fizeram sexo com seus homens, deram à luz e amamentaram seus filhos para que hoje estivéssemos aqui. Esses afetos produziram ideias na mente das pessoas, dando-se nome a eles: pai, mãe, filhos, família. Outros afetos eram aluno, professor, escravo, senhor, servo, aprendiz. Mesmo as sociedades que sabemos ser mais explícitas outras relações sexuais não ousaram chamar esses prazeres de família. Existe uma ideia natural de família que veio da própria natureza.
A organização estatal, em sua evolução histórica, veio a reconhecer essa instituição, anterior ao próprio Estado. Tomou como seu dever tutelá-la e protegê-la, por reconhecer nela a célula fundamental da sociedade, de fato a primeira comunidade em que os seres humanos são gerados e recebidos e onde aprendem, bem ou mal, a conviver. É de interesse público notório o bem que a família natural produz na sociedade. À parte outros bens, ela garante que possamos falar de sociedade, pois garante que possamos vir à vida. Sua importância é tal, que sem ela não há sociedade.
O reconhecimento de fenômenos naturais que regem o comportamento e a própria condição de existência do ser humano e da sociedade leva a crer que há uma lei moral natural que não está necessariamente escrita, expressa, mas que se desobedecida, colocará em risco a legitimidade da lei positivada. Aqui me oponho, decerto, ao chamado Direito Positivo, à medida em que se abre a possibilidade de estabelecer, através das leis humanas, realidades contrárias à própria natureza do homem. Me oponho também às filosofias que pregam uma determinação do homem por ele mesmo, como se ele fosse capaz de se autoconstruir e autodeterminar e não estivesse limitado a nada exterior a ele. A lei civil, portanto, quando se afasta em demasia da realidade humana corre o risco de perder a força de obrigar a consciência, corre o grave risco de gerar uma mentalidade e um costume artificial, não conforme a natureza, que foge à verdade, e, por consequência, ao bem. Os modelos e conceitos nela expressos tendem a inundar a língua corrente, se tornando rapidamente senso comum, moldando nas novas gerações a compreensão e avaliação dos comportamentos.
Os sistemas jurídicos contemporâneos celebram, felizmente, os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade em suas Leis Maiores, o que permitiu acabar com diversas injustiças. Primam, também, pela busca da isonomia, que desde Aristóteles é muito bem entendida como "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais". É essa igualdade justa que não permite que surjam discriminações sem uma base lógica e racional para tal. É essa desigualdade justa que permite à mulher licença maternidade, que permite aos idosos e deficientes tratamento diferenciado, dentre outras coisas, por reconhecer motivos naturais para tal. É essa desigualdade justa e digna que confere, naturalmente, lugar de honra à realidade única que é o modelo homem-mulher-filhos, que a natureza nos coloca, independente de nossa vontade. (Pode-se dizer que é um monopólio natural, que nunca será suplantado por outra configuração em sua potencial geração de novas vidas.) Esse reconhecimento específico confere diversos direitos aos indivíduos que realizam esse modelo.
Pois bem, com o objetivo de que esses mesmos direitos sejam integralmente estendidos a outros tipos de relações, pautadas tão somente por laços afetivos, está-se recorrendo à desconstrução conceitual desse modelo. Precisa-se mudar a ideia de família nos conceitos jurídicos, para que as leis possam ser alargadas. É isso que vem sendo feito no mundo, e no Brasil, com o objetivo claro e declarado de construir um novo modelo familiar, equiparando-o conceitualmente ao modelo natural, não somente no ordenamento jurídico, mas na mentalidade da sociedade. O modelo de família que está sendo proposto ao povo brasileiro é o de uma comunidade de pessoas unidas somente por laços afetivos, contemplando, assim, diversas configurações possíveis. A dimensão procriativa, que é tão cara à nossa existência, é colocada como um mero detalhe, quando não totalmente dispensável. Exemplos desse movimento na atividade do STF brasileiro podem ser conferidos nos links:
Pode-se ver já um reconhecimento de fato desse novo conceito na legislação infraconstitucional, como por exemplo na Lei Maria da Penha.
Seria justo e coerente modificar conceitos a fim de conceder direitos a uma classe que definitivamente não irá produzir o mesmo grau de benefício à sociedade que a família natural? Não se poderia criar uma outra condição jurídica de forma a produzir os efeitos materiais reclamados por esse indivíduos, dignos em sua condição humana, mas definitivamente estéreis? Não seria, também, um desrespeito à condição humana e à justiça equiparar situações que naturalmente são impossíveis de ser equiparadas sem atentar contra a reta razão que nos diz que dois homens ou duas mulheres, por mais que queiram, não conseguirão produzir o mesmo efeito que um homem e uma mulher, considerando iguais coisas que não são? Pode-se falar em dignidade da pessoa sem honrar e respeitar o processo que faz com que essa pessoa venha a existir? As sociedades estão enfrentando, cada vez mais, complicados problemas demográficos e previdenciários com a queda das taxas de natalidade. Alguns países estão percebendo que correm o risco de diminuírem perigosamente sua população. Não seria a hora de voltar a valorizar a família natural? Creio que a construção artificial de uma mentalidade que não dá o devido e justo lugar ao mistério da vida humana não irá contribuir para o bem da nossa civilização.
Afinal, temos o direito de ditar à natureza o nosso Direito? De minha parte, cada choro de bebê que eu ouvir será para mim um testemunho da natureza de que não há lei humana que revogue essa realidade tão bela: todos somos filhos de um pai e de uma mãe.